quinta-feira, 4 de outubro de 2012

Fragmentos

Não sei se porque era domingo, pelo frio ou pela breve chegada de agosto, sei que a saudade era grande e a dor latejante. Dormi pra poder te encontrar pelo menos nos meu sonhos e lá te achei por instantes confusos porém marcantes, acordei, lembrei e te perdi de novo.
Parece que vivo incompleta, pintei mais os olhos, nada como uma boa maquiagem para disfarçar a tristeza e realçar a beleza que brota dela, mas uma coisa é certa, saudade é um sentimento que perdura e não tem cura!

(Fabiana Leivas)

segunda-feira, 1 de outubro de 2012

(PELO DIREITO À) PAUSA PARA REFLETIR



Faz menos de duas décadas que o brasileiro livrou-se oficialmente dos grilhões da censura. O que não quer dizer que o fantasma não mais nos assombre. Recentemente, o governo dos trabalhadores, cujos integrantes desde os primeiros anos da revolucionária década de 80 bradaram contra tudo e todos (e continuam bradando com a mesma imponência, só que do outro lado da mesa e defendendo-se), tentou costurar acordos e apoios espúrios nos corredores do Planalto para controlar a imprensa. Ainda bem que, momentaneamente, esses esforços típicos do caudilhismo sul-americano tenham sido estancados, e, pelo bem geral da nação, esperamos que a situação assim permaneça, vitaliciamente.

Pois, na semana que passou, presenciamos novo grito de censura. Um parlamentar, após assistir um filme não recomendado a menores de 16 anos acompanhado de seu filho de 11 primaveras, vestiu a tão bem conhecida armadura de “ôtoridade” e, ajudado pela instantaneidade das comunicações cibernéticas, iniciou uma batalha irracional para, em seu primeiro intento, tirar o filme de circulação. Brasileiro sabe dar show, isso é senso comum. Mas o bom senso exige voz baixa e raciocínio pausado e afiado. Primeiro: ainda que amparado pela lei, por estar acompanhando o seu filho, o parlamentar em questão assumiu, ele e mais ninguém, o risco de que seu filho assistisse algo que não era para sua idade. O filme foi avaliado por uma comissão tecnicamente capaz de fazê-lo. Portanto, o hiato de 5 anos entre a idade do espectador e a idade mínima recomendada não pode passar em branco. Segundo, e o mais importante: tirar o filme de circulação? Como assim, meu senhor? Isto é censura! O Brasil não é o país da democracia? O país que exporta a melhor urna e blá-blá-blá? Devemos dar este exemplo de democracia. Num momento em que ambicionamos uma posição de titular no escrete global, dar um grito ditatorial como esse é contraproducente. É honrar o que de mais vergonhoso temos em nossa sociedade: o dois-pesos-duas-medidas. Pois imoralidade e indignidade, para qualquer um ver, seja qual for a idade, é o que mais há nesse país.

Outra discussão bem válida neste mesmo tópico foi o recente caso do vídeo que deflagrou um ódio endêmico nas nações islâmicas. Sim, o vídeo é uma completa agressão a toda e qualquer noção de bom gosto, respeito religioso e qualidade de produção. Mas a correta postura das autoridades norte-americanas no que tange a liberdade de expressão é digna de elogio. O presidente Barack Obama e sua equipe atravessaram com maestria a areia movediça que tornou-se a discussão em torno da liberdade de expressão. Porque liberdade de expressão não é isenção de responsabilidade. Quem faz a arte tem que responder por ela. Mas pode fazê-la, e ponto. Não vou entrar nos pormenores do caso: equipe ludibriada e utilizada por um diretor inescrupuloso et cetera; se o cidadão foi canalha com sua equipe, ele vai responder propriamente por isso. Mas a simples ameaça à liberdade de expressão já gerou celeuma na sociedade norte-americana. A mesma celeuma que o citado parlamentar enfrentou, em sua conta no Twitter. As demonstrações foram milhares, em milhares de formas e conceitos e opiniões, mas a chama-mestra de todas é a mesma: não há nada que o ursinho do filme faça que não se veja na sociedade. Quer o senhor queira, quer não. Permitir que os maiores de 16 anos (ou 18, conforme a reformulação do protesto do parlamentar pretende) vejam o ursinho fumar um beise, tomar todas e ser misógino é um direito constitucionalmente garantido. Acho muito mais nocivo para um adolescente ver o Paulo Maluf apertando a mão do Lula, ou ver um policial indiciado pelo Massacre do Carandiru, ocorrido há 20 anos, comandar nos dias atuais o batalhão policial conhecidamente mais truculento do país, a ROTA paulistana.

A arte é um caleidoscópio, com milhares de facetas e cores e formatos. E não é obrigatória. Cada um absorve a arte que quer, se quiser. Porque cada arte tem uma forma de expressão, uma ideia, uma mensagem. Arte livre é liberdade de expressão. Liberdade de expressão é democracia. Constituição de 1988, e ponto final. Só evolui a sociedade que sabe se avaliar. Arte é avaliação e abstração de vida. Deixar a arte livre é uma forma de deixar seus cidadãos olharem para si mesmos e refletirem. A mesma finalidade possui a educação. Uma sociedade democrática honra a arte e honra a educação. Porque sabe que cidadãos que possam expressar-se criativamente vão surgir com novas ideias. Porque sabe que cidadãos bem instruídos vão pegar essas novas ideias e trabalhá-las até que, otimizadas, possam gerar os melhores resultados. Dizer que algo não pode ser exposto é censura. Determinar que tipo de arte pode chegar ao povo que os senhores, caros políticos, representam é censura. Vemos com clareza o que ocorre na China, em Cuba, na Coreia do Norte: arte, em governos ditatoriais, nada mais é que propaganda (os caribenhos, para seu bem, gozam de um pouco mais de liberdade que as outras duas nações citadas). Arte, nessas conjunturas, vira instrumento de controle ideológico e social. Nessas sociedades, a arte livre não morre, mas fica relegada ao submundo. E arte, meu senhor, é um pássaro, tem que voar livremente. Dentro do universo da arte, há todo tipo de pássaro, de sabiás a urubus. Mas gosto é coisa individual. Eu posso ter ojeriza a pombos, mas tem quem goste. Não tenho a mínima intenção de exterminá-los, apenas os evito. Com arte é a mesma coisa. O ursinho, meu senhor, não precisa aparecer na TV aberta; concordo que nem o deva. Mas negar sua existência, e a importância da reflexão que ele possa proporcionar, é de uma ignorância sem tamanho.

(Diego Vargas)