terça-feira, 8 de janeiro de 2013

FELIZBOOK

Como você está se sentindo?” É pergunta de resposta condicional. Depende de quem perguntou, onde se está, o momento em si; tudo isso dita o ritmo, o detalhamento e a emoção que a resposta vai carregar. Regem as normas de boas maneiras que, salvo algumas exceções, nossa resposta deve ser “Está tudo bem”, afinal o desabafo deve ser guardado apenas para os mais próximos e, mesmo assim, apenas em determinados momentos.

Como se responde, então, quando a pergunta é feita por uma rede social? Só aí a gente já consegue abrir parênteses. Esqueçamos o morimbundo orkut, cuja sobrevida me surpreende. Para mim, este já havia recebido a extrema-unção há algum tempo. Refiro-me especificamente ao Facebook, a grande vitrine atual da vida de todos. Muito interessante, bem desenvolvida e engendrada. Conecta diversos aplicativos e serviços, possibilita comércio e outros ganhos pessoais. Afora usos profissionais e comerciais, está cada vez mais se tornando o endosso da grande lei social decretada pelo brilhante Andy Warhol: “No futuro toda a gente será famosa durante quinze minutos”. Pois, maravilha pura, o Facebook te possibilita de forma dinâmica, em um feed de notícias (uau, vira-se notícia, manchete!), transformar em fábula sua vida. Prolongar os ditos quinze minutos. E a função é retroalimentada, porque a sua notícia motiva a minha notícia. O raciocínio é simples: celebridade tem que aparecer, senão cai no ostracismo. E tem que aparecer feliz, “sarada”, bem vestida e com uma taça de espumante (jamais nacional) na mão. Feliz, no conceito “Caras” da coisa. Ocorre que, desculpe informar, felicidade enquanto estado infinito e eterno é uma utopia, das mais nocivas. A vida é feita de azedas e amargas batalhas, resolução de problemas cotidianos ou graves e, nos breves intervalos, momentos felizes. É a busca desses momentos que nos motiva a vencer as pequenas e diárias agruras. Nem mesmo as celebridades, dentro da acepção tradicional do termo, gozam de felicidade eterna. Volta e meia vê-se isso nos questionáveis portais de fofocas, de alguém que perdeu a linha, a pose e, às vezes, até a vida, em função de alguma decepção.

Todo mundo que ali está incorre nesses pecadilhos sociais, nesses excessos cibernéticos. Ninguém tem teto de vidro neste sentido. Mas, além de endêmica, a questão tem se mostrado interminável. São dezenas de instrumentos, como foto-montagens, citações de autores famosos (outro detalhe: em boa parte das vezes, tanto a autoria está erroneamente creditada, quanto a frase em si sequer existiu e, muito menos, foi proferida pelo referido autor), ou o bom e velho desabafo. Por quê? Porque o “Como você está se sentindo?” lido na caixa de texto é uma extensão do excesso de informação que se tem no feed em si. É um misto de autoafirmação com lamento com descrição de intempéries e convulsões cotidano-sociais com resultado de jogos de futebol com “modelices” com divulgação de empreendimentos e trabalhos com piadas e troças com propaganda e revolta política com manifestações religiosas com... CHEGA! Pare, respire. Todos esses itens e assuntos que citei são integrantes da vida de todos nós, sem dúvida, e devem ser divididos. Pode até ser por meios eletrônicos, hoje em dia a vida é corrida e é só o que nos resta para comunicarmo-nos com nossos entes queridos. Agora, valer-se sempre do arremessar de conteúdo num feed de notícias vira um vício, o que obviamente gera crise de abstinência. Como citei acima, a coisa é retroalimentada e, uma hora invariavelmente, pode vir a transbordar. Transborda porque perfeição não existe, porque felicidade ocupa menos espaço e pesa menos que a tristeza. Mas como, e reafirmo, felicidade é feita de pequenos momentos que preenchem os rejuntes das lajotas gélidas e cotidianas de nossa existência, o resto é o que pesa mais. E vai pesar sempre, não se iluda do contrário. Mas faz parte da existência aguentar os pequenos problemas no osso. São as adversidades que nos fazem evoluir. As vitórias, conquistas e felicidades apenas confeitam a vida; a massa do bolo é feita das lutas, e o fermento nada mais é o quão bem reagimos aos insucessos.

Redes sociais são interessantes, nos fazem retomar ou manter contato com pessoas queridas que já passaram, às vezes há muito tempo, por nossa vida. Já se versou que estamos esquecendo de olhar para o lado e para o entorno, apenas para falar com as centenas de “amigos” (reveja mentalmente este conceito, também, para o seu bem) do Facebook, e devemos nos policiar nesse sentido. A vida real é que nos faz... reais. “Como você está se sentindo?” Acho uma pergunta gostosa, um abraço feito de letras, quando feito por alguém querido e num momento de intimidade. Feliz, maravilhado, chocado, supreso, angustiado... Estados de espírito inerentes à condição humana, que dividimos para nos aliviar. Mas não existe vulcão na face terrestre que fique em erupção eternamente, uma hora a coisa ventila, areja. Sem exageros, menos é mais. Menos virtualidade é mais realidade. Foi o (ovo de Colombo) que realizei num churrasco com dois amigos que não via há tempos. Momento real, tangível, que nenhuma virtualidade consegue substituir. Se volto ao Facebook? Deixo a resposta a cargo do futuro, até porque, para mim, transbordou.

(Diego Vargas)

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