A
perda de um familiar é uma situação deveras específica. Cada
família tem a sua dinâmica, as suas afinidades particulares (brigas
igualmente); mas família a gente não escolhe. Família é
multiformatos, cada um tem o seus conceitos de “família” e
“parentes”, cada perda depende de cada relação, de cada...
família. Já perdi familiares amados, sei como cada dor foi. Mas o
que perder um tio foi para mim, por exemplo, pode não ser a mesma
coisa para você. Vamos largar a hipocrisia e confrontar a verdade:
amor incondicional é só de pais para proles, e ainda assim há
exceções. Não vou me arriscar, por absoluta ignorância, na
questão da perda de um filho. Vi com uma de minhas avós (que já
não está mais aqui, aliás) o quão devastador isso pode ser. Mas
se não sei o que é ter um filho, não tenho sequer como me
aproximar do que venha a ser perder um.
Amor
é um assunto mais complicado; eu acho que é como um sequestro, que
só vai em frente, quando vai, devido à Síndrome de Estocolmo. Nos
apaixonamos por quem nos raptou (e que tão bem sabe apertar nossos
botões, na sequência correta). Portanto, recuperar-se da perda de
um é processo particular. Mal ou bem, a gente acaba arranjando
outro, se quiser. Fica um buraco no peito, pode ser que nunca mais se
ame da mesma forma; tenha falecido ou não, um amor perdido deve ser
tratado como tal, em nome de sua própria saúde. Amor envolve sexo,
suor, lágrimas e juras infinitas. Com tanta troca assim, cada um
processa a perda como quiser: manifestações artísticas, farras
etílicas, “passadas de rodo” históricas, isso e muito mais, e
tudo regado a muito chocolate.
Agora,
perder um amigo... Quem perde um amigo, perde um universo (de regras
particulares, diga-se). Porque amizade verdadeira também começa com
um “Big
Bang”.
Essa eclosão, esse momento de gênese, pode ser um brinde entre duas
tulipas de chope geladíssimo, pode ser uma gargalhada conjunta
depois de um comentário extremamente irônico no local de trabalho,
pode ser tanta coisa... Já disse Aristóteles: “Amizade é haver
uma alma em dois corpos”. A amizade fraterna envolve um pouco
daquela química da paixão, só que (a princípio, “cadum cadum”)
sem o sexo. É um encaixe de alma. Um encaixe que, como disse acima,
constrói um universo. E são vários universos, feito um multiverso,
que perfazem o que chamamos de “roda de amigos”. Uma roda de
liberdade, troça, um pouco de anarquia e muito carinho. Quem já
morou longe de sua terra sabe o quão família uma roda de amigos
pode se tornar. Com o tempo, aprendemos quem são os nossos reais
amigos (em especial quando os ventos não são favoráveis; aí sim
separamos o joio do trigo).
E
perder um amigo, principalmente um irmão de alma, é perder o lado
físico de algo que você construiu a quatro mãos, em igualdade de
condições, sem hierarquias e sem obrigações pré-existentes. Uma
convivência voluntária e pacífica que, em seu mais metafísico
aspecto, foi um produto do acaso. Facilitado por circunstâncias,
pode ser, mas que foi uma colisão de vidas. Somos sete bilhões de
cabeças neste planeta, quase duzentos milhões só em nosso país.
Criar um verdadeiro vínculo de amizade é, acima de tudo, uma
bênção. Família em primeiro lugar, ao menos para mim; amor tem o
seu próprio lugar (conforme o desenrolar, claro). Mas amizade, essa
sim, é “o” lugar. Lugar de rir, chorar, beber, dar Coca-Cola
quando a coisa pegar, dar bronca, dar dica, comprar briga, ganhar
visão de mundo e, acima de tudo, aproveitar a vida.
P.S.:
Ainda bem, não perdi nenhum grande amigo recentemente. Mas um amigo
querido acaba de perder um amigo-irmão, e é para ambos que dedico
estas palavras. Além de dedicá-las ao “figuraça” Maurício,
irmão de alma que, há sete primaveras, está zoando com todo mundo
em alguma nuvem, alguma estrela lá em cima; e que para sempre será
lembrado como alguém que veio aqui para mostrar que é alegremente
que se leva a vida.
Diego Vargas
Diego Vargas
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